Sofrer com a ansiedade é mais comum do que muitos imaginam:
somente no Brasil, cerca de 13,3 milhões de pessoas têm distúrbios de ansiedade,
doença que atrapalha relacionamentos, desempenho profissional e o bem-estar
físico e emocional do indivíduo.
No ano passado, 6,4% da população brasileira sofria com
transtornos do tipo, bem mais que a média global, de 3,9%, de acordo com
estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Mas o que é um transtorno de ansiedade e como diferenciá-lo
da ansiedade natural? De acordo com Olivia Remes, doutoranda e pesquisadora do
Departamento de Saúde Pública e Cuidados Primários da Universidade de Cambridge,
na Inglaterra, transtornos de ansiedade generalizada são caracterizados por
sensações frequentes de medo, inquietação, e de "sentir-se no
limite".
"Quando uma pessoa tem um prazo apertado ou uma
emergência no trabalho, ela se sente ansiosa e isso é normal. Mas há pessoas
que se preocupam com cada ponto de suas vidas e não conseguem se livrar
disso", explica. "Pessoas com esse transtorno se preocupam muito mais
frequentemente e com mais intensidade que aquelas com uma boa saúde mental."
Apesar dos distúrbios de ansiedade serem um problema sério,
que muitas vezes demanda acompanhamento com especialistas, é possível
desenvolver habilidades para lidar com o transtorno.
Abaixo, Remes compartilha diferentes estratégias para
enfrentar o problema, com base em um estudo recente que liderou.
1. Monitore os seus pensamentos
Quem sofre com transtornos de ansiedade geralmente se vê
tomado por pensamentos negativos que invadem a mente sem aviso. "Pessoas
com transtornos de ansiedade são pessimistas. Elas acreditam que algo ruim está
prestes a acontecer, mesmo que não haja nenhuma evidência que aponte para isso.
Elas temem o futuro e acham muito difícil evitar esse tipo de preocupação",
descreve a pesquisadora.
Para contornar tal situação corriqueira aos ansiosos, Remes
sugere não lutar contra os pensamentos negativos, mas escolher uma hora do dia
como o "momento da preocupação" e se permitir um período limitado de
tempo para ruminar. Como exemplo, Remes recomenda designar o horário das 16h
para as preocupações e dar a si mesmo 20 minutos para preocupar-se.
"A literatura psicológica mostra que nossos pensamentos
murcham se não os alimentamos com energia. Ao empurrar esses pensamentos para
um outro momento do dia, quando você chegar no momento designado para a
preocupação, eles talvez não pareçam tão confusos ou preocupantes como pareciam
quando brotaram em sua mente pela primeira vez", explica Remes.
2. Faça atividades físicas e pratique meditação
A famosa citação latina "uma mente sã num corpo
são" não é gratuita. Saúde mental e física são codependentes, afirma
Remes, e a prática de exercícios físicos é um aliado essencial para o bem-estar
psíquico. Em conjunto com exercícios regulares, a meditação consciente também
pode ajudar mentes ansiosas.
Um estudo da Universidade de Nova Jersey, publicado
recentemente na revista Nature, mostrou que apenas duas sessões semanais de
meditação e atividades físicas, de 30 minutos cada, reduziram drasticamente
sintomas depressivos nos 52 participantes da pesquisa. Os pesquisadores
concluíram que, ao cabo de oito semanas, além de auxiliar aqueles com
depressão, a prática também poderia ser útil para aqueles que tendem a ruminar
pensamentos, algo comum entre os ansiosos.
"Eu realmente fiquei muito surpresa com esse estudo,
com o quanto essas mudanças de hábito podem ter um impacto tão grande",
afirma Remes. "Quando você se exercita, você diminui seus níveis de
ansiedade e você tem mais energia. Você simplesmente se sente melhor como um
todo", aponta.
3. Encontre um propósito - nem que seja cuidar de seu animal
de estimação
Em 1946, o médico austríaco Viktor Frankl publicou o livro
Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, no qual narrou suas
experiências como prisioneiro em Auschwitz. Frankl também analisa a resposta
psicológica de diferentes prisioneiros expostos ao campo de concentração
nazista e argumenta que encontrar sentido no cotidiano é uma forma de lidar com
a adversidade.
De acordo com Remes, pessoas com distúrbios de ansiedade
muitas vezes não conseguem identificar um propósito claro em suas vidas e nem
sempre acreditam que vale a pena investir esforços para endereçar os desafios
que encontram. Em seu estudo recente sobre níveis de ansiedade em mulheres que
vivem em situações de privação econômica, Remes encontrou que aquelas que
tinham senso de coesão, de propósito e que enxergavam sentido em suas vidas,
tinham menos distúrbios de ansiedade, mesmo vivendo situações difíceis.
Para a pesquisadora, as lições de Frankl, mesmo extraídas de
uma experiência dramática, são um mecanismo útil para aqueles que sofrem com
ansiedade. "Nos relatos de Frankl, um traço de personalidade que
diferenciava os prisioneiros eram aqueles que conseguiam manter um propósito
mesmo naquela situação. Para um era saber que sua filha o aguardava, então ele
precisava sobreviver para ela e isso lhe deu esperança. Para outra, era saber
que ela tinha um trabalho importante para finalizar", afirma.
No cotidiano, ter a sensação de que você é necessário para a
vida de outra pessoa ou para uma atividade específica auxilia na construção de
propósito. Tal senso de conexão pode ser traduzido em atividades de
voluntariado, em cuidados com um familiar enfermo, na educação de uma criança
ou mesmo nos cuidados com um animal de estimação, aponta Remes.
"Quando você coloca seu foco em algo além de você, esse
ato te ajuda a dar um tempo de si mesmo", explica. "Ter outras
pessoas em mente é muito importante, porque torna um pouco menos penoso passar
pelos momentos mais difíceis."
4. Veja o lado bom da vida (por mais que isso seja
desafiador)
Por mais clichê que possa soar, adotar uma atitude positiva
perante à vida, com foco nos aspectos bons ao invés dos ruins, é essencial para
lidar com a ansiedade. Para domar a mente e espantar os pensamentos negativos,
Remes recomenda olhar para elementos que te dão prazer, ao invés daqueles que
te irritam ou que te deprimem.
Embora controlar quais pensamentos te veem à mente seja
impossível, é possível dialogar com eles uma vez que se fazem presente. Se, ao
chegar em um ambiente, algo negativo te chamar a atenção, busque encontrar algo
que seja positivo. Se no caminho para o trabalho o trânsito estiver
estressante, busque ouvir uma música que te conforte - ou mesmo mude a maneira
de se deslocar ao trabalho. Essa atitude positiva perante os pequenos momentos
da vida tendem a reverberar também no bem estar emocional do indivíduo, aponta
Remes.
Nas situações em que pensamentos negativos intensos invadem
a mente, focar em outras atividades do corpo, como a respiração, também é uma
forma de amenizar seus efeitos. "Reconheça que esses pensamentos
catastróficos que vêm à mente, que te fazem se sentir péssimo, são apenas
eventos mentais que irão passar", diz Remes.
5. Viva no presente
A prática de ruminar pensamentos e ser constantemente
tragado por memórias do passado tende a alimentar a ansiedade. Preocupar-se com
o que pode ocorrer no futuro também pode deixar o indivíduo mais ansioso.
Embora muitas vezes esses pensamentos sejam difíceis de controlar, Remes aponta
que é importante manter um foco constante no que você está fazendo agora.
"Estudos mostram que, quando nós vivemos no passado,
revivendo memórias antigas, essa atitude nos deixa depressivos e menos felizes.
Na verdade, ficamos mais felizes quando vivemos no momento presente. Se você
está trabalhando, simplesmente foque naquilo que você está fazendo.
Simplesmente viva no presente", diz.
6. Busque terapia
Nem sempre é possível lidar sozinho com distúrbios de
ansiedade, e a terapia é uma grande aliada para melhorar a saúde mental. Em
casos assim, uma possibilidade é a terapia cognitivo-comportamental, cujo
princípio básico é buscar uma postura construtiva do paciente.
Nesse sistema de psicoterapia, a hipótese central aponta que
a forma como entendemos eventos internos e externos - e não o evento em si - é
que determina nossas respostas emocionais e comportamentais.
De acordo com Remes, a solução é preferencial ao consumo de
medicamentos, quando for possível optar. "Em muitos casos, medicamentos
não funcionam, ou funcionam apenas no curto prazo e os problemas retornam
depois de um tempo", aponta. Para a pesquisadora, trabalhar para
desenvolver habilidades de enfrentamento à ansiedade e buscar terapia são as
melhores formas de lidar com o transtorno.
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