
Certa vez, estava eu em
sala de aula ainda na graduação em psicologia, quando questionaram ao meu professor:
“Todas as pessoas precisam de um
psicólogo?” e a resposta foi: Não. Mas
todos merecem um.
Se por um lado entendi
que não seria uma necessidade mas sim uma oportunidade. Do outro, entendo que
esta diferença poderia explicar o fato de o paciente ter que fazer um
investimento em si mesmo, o que muitas
vezes resulta no sentimento do não merecimento. O não se sentir “merecedor” do
olhar do outro. E por fim, negamos veemente
esta ajuda que neste caso se materializaria na figura do
psicólogo.
Diante desse pensamento
eu começo a explicar do meu modo singular o papel deste profissional na vida de seus
pacientes.Não pretendo fechar este assunto, mas ampliar os seus sentidos, pois,
ser psicólogo é um caminho percorrido sempre no plural. E para ilustrar esse
pensamento quero trazer duas figuras que nos representam. Sancho Pança e Virgílio.
Sancho
Pança é um personagem do livro Don
Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes. Atua como um personagem
contraste ao personagem principal, o próprio Dom Quixote.Enquanto Quixote é
sonhador e fantasioso, Sancho Pança é realista e sério. Na medida em que o
relato avança, Sancho, aos poucos, vai aceitando os "delírios"
do cavaleiro de quem é o fiel escudeiro. Sancho Pança decidiu
acompanhar Dom Quixote após este ter prometido que lhe daria a governação de
uma ilha. Apesar de entender que é um delírio, mas aceita o caminho junto a Don
Quixote.
Mesmo
pobre, continua fiel a Dom Quixote como ditado dos cavaleiros (um cavaleiro
nunca foge a uma luta) e Sancho nunca fugiu de Dom Quixote. Nunca lhe faltava
ao respeito, sendo sempre fiel. Normalmente andava em cima de um burro, junto
de Dom Quixote que andava em cima do seu cavalo: o Rocinante umas das
evidências do contraste dos personagens. Sancho Pança era gordo e baixo.
Uma das
partes que eu mais gosto desse livro é quando Don Quixote vai lutar contra os
gigantes e Sancho Pança tenta avisá-lo que os gigantes são na realidade moinhos
de vento, mas Don Quixote explica para Sancho que os gigantes se disfarçam de
moinho de vento. Nesse momento Sancho entende que não seria possível trazê-lo a
realidade naquele momento e assim faz uma escolha de acompanhar Don Quixote em
sua fantasia. E assim eles atacam os gigantes, ou melhor, os moinhos de vento.
O que
chama a atenção seria que Sancho Pança vai entendendo e vai entrando cada vez
mais nas alucinações de seu amigo e conforme ele vai acompanhando vai ajudando
seu amigo Don Quixote a sair desse mundo de fantasias e onipotências.
O
psicólogo, no meu entendimento, tem esse papel, ele precisa entrar e caminhar
com seus pacientes e muitas vezes acreditar quando ninguém acredita, entender
seu papel e contrastes, de chamar seu paciente para a realidade, pois não
lutaremos com os gigantes, mas não podemos deixar nossos pacientes sozinhos com
eles, então os acompanhamos.
Virgílio teve uma influência ampla e profunda na literatura
ocidental, mais notavelmente na Divina Comédia de Dante,
em que Virgílio aparece como guia de Dante pelo inferno e purgatório. Dante leu
Virgílio, ele se influenciou pela sua escrita e escolheu esse poeta para ser
seu guia no inferno.
Quando falamos de Virgílio no conto de Dante uma das imagens que eu
adoro nesse livro é quando Dante pergunta para Virgílio porque ele não o
ajudaria a combater os demônios e Virgílio responde que não poderia, pois ele
era apenas um espírito e estava ali apenas para acompanhá-lo.
Para concluir esse pensamento gostaria que entendessem estas metáforas e caminhassem comigo por esses dois
personagens que para mim representam o
ser psicólogo.
Eles são dois acompanhantes que querem trazer seus pacientes para vida,
mas estão de mãos atadas, pois na busca da autonomia de seus pacientes não podem
lutar por eles, mas estes estão dispostos a lutar com os gigantes e descer ao
inferno com eles. Seus objetivos são o de não deixá-los sozinhos.
Os resultados não são sempre positivos, mas precisam entender que podem
contar com seus acompanhantes e merecem um espaço onde podem reviver e dar um
novo sentido para esses momentos.
Nem todos precisam de um psicólogo, mas todos merecem ter um
acompanhante, um escudeiro e um sábio para ajudá-los.
Psicólogo, apenas por hoje.
Daniel FrankPsicólogo Clínico
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