Anedonia: a vida em preto e branco

Anedonia, etimologicamente, faz referência a Hedone, a deusa grega do prazer e, com seu “a” de negação, já sabemos o que a palavra quer dizer. Anedonia é a dificuldade ou incapacidade de uma pessoa em sentir prazer ou se motivar a realizar atividades que antes eram prazerosas. Isso inclui reuniões com amigos, uma atividade de lazer ou mesmo o prazer sexual, com a pessoa muitas vezes relatando que “a vida perdeu o sabor” ou que “não consegue vibrar com mais nada”. Ocorre mais comumente na Depressão (sendo um dos critérios diagnósticos), mas também pode ocorrer na Esquizofrenia e em quadros crônicos de outros transtornos (como as Fobias e o TOC).
Na anedonia, a pessoa tem dificuldade em sentir prazer ou vontade de realizar atividades prazerosas, como se sua vida “ficasse em preto-e-branco”.

Afeto, humor, sentimento e emoção

São praticamente a mesma coisa, não? Bom, na psicologia e na psiquiatria são conceitos diferentes. O afeto humano é complexo e, assim, seu estudo é igualmente complicado, sendo necessário definir em detalhes os diversos estados afetivos que podemos ter a fim de entender melhor suas alterações do dia-a-dia ou na vigência de um transtorno mental. Por isso, essas palavras não são sinônimos.
Afeto é um conceito mais amplo. É qualquer qualidade emocional que acompanha uma ideia ou pensamento e, assim, engloba os conceitos de humor, sentimento e emoção.
O humor é um “tônus emocional”, como que um plano de fundo com uma longa duração que orienta as experiências afetivas de um indivíduo em determinado sentido (ex: um humor depressivo favorece sentimentos e emoções negativas em relação às situações sendo vivenciadas).
As emoções são estados afetivos intensos e agudos, porém curtos. Ou seja, são reações desencadeadas por estímulos internos ou externos, conscientes ou inconscientes.
Já os sentimentos são intermediários entre o humor e as emoções, mais estáveis e menos intensos. Estão relacionados ao conteúdo intelectual e cultural de cada pessoa.
Em resumo, dentro de um “plano de fundo” emocional chamado humor, temos, dependendo do contexto e dos valores culturais de cada um, sentimentos diversos orientados por ele (melancolia, saudade, culpa, contentamento, confiança, raiva, revolta, amizade, amor, gratidão, etc). E, uma vez tomados por determinado sentimento, temos reações afetivas mais intensas que ocorrem imediatamente após um pensamento, uma conversa, uma lembrança ou outros desencadeadores, chamadas de emoções (as quais, em geral, não são definíveis por palavras).

Anedonia x apatia

Mas qual seria a importância dessa diferenciação de conceitos? Bom, muitas vezes confundimos a anedonia com a apatia. Ambas frequentes nos transtornos mentais, nem sempre estão presentes simultaneamente. A anedonia se aproxima mais de uma alteração das emoções que do humor e do sentimento: a pessoa não sente prazer (uma reação emocional mais aguda a certas atividades que causam “bem-estar mental”), mas ainda pode ter seu humor e sentimentos bem ativos (mesmo que seja na forma de um humor depressivo, por exemplo). Já a apatia é a incapacidade de sentir afetos, o que quer dizer que estão comprometidos desde o humor até os sentimentos e as emoções, como que numa ausência completa de experiência afetiva (ou uma espécie de “afeto neutro/indiferente”).
Em psiquiatria, que trabalha com a elaboração de diagnósticos, um erro de diferenciação entre esses dois termos pode culminar em erros de conduta.
Por que saber sobre ela?
Sendo a anedonia um sintoma, mais que um transtorno em si, seu tratamento envolve o tratamento da condição subjacente, tendo ela um valor mais diagnótico que terapêutico. É importante entender que um paciente com anedonia nem sempre é depressivo: muitas doenças orgânicas, pela incapacidade que causam, ou outros transtornos mentais podem causar anedonia nos pacientes. Da mesma forma, não se deve esperar a anedonia para diagnosticar um quadro depressivo. E, assim como dito anteriormente, é preciso conhecê-la para diferenciá-la de condições semelhantes (como a apatia), mas que têm significados diferentes dentro na fisiopatologia das doenças.
De qualquer maneira, é uma condição que merece atenção pela acentuada redução da qualidade de vida que provoca, favorecendo o surgimento de quadros depressivos, quando esses ainda não estão presentes, e mesmo aumentando risco de suicídio em pacientes psiquiátricos. Conhecer a psicopatologia envolvida e a neurofisiologia por trás do quadro permitirá a melhor compreensão da saúde mental e seus distúrbios, bem como melhores tratamentos para os pacientes com anedonia.

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